Fila da oftalmologia na rede pública do Rio está perto de zerar após inauguração do Centro do Olho

Glaucoma
Exame para detectar o glaucoma. Foto: Divulgação/SBG

O Globo – 07/06/2023

Espera por consulta de glaucoma na rede pública carioca foi ‘zerada’, mas há outros desafios à vista

Maria Neida Falcão, 69 anos, gosta de ler no tempo livre — títulos sobre História do Brasil são os seus favoritos. Também por isso, o diagnóstico de glaucoma e o medo de perder a visão a afligiram bastante. A assistente social aposentada só ficou mais tranquila depois de passar por exames no Supercentro Carioca de Saúde, em Benfica, Zona Norte. E aí veio outra boa notícia: seu acompanhamento se deu de forma bastante rápida porque, de acordo com a Secretaria municipal de Saúde (SMS), a fila de glaucoma do Rio no Sistema Nacional de Regulação (Sisreg) foi “zerada”.

Moradora da Tijuca, Maria Neida reclamava de dificuldade de enxergar tanto perto quanto longe e chegou a fazer os procedimentos de risco cirúrgico para operar catarata. Quando relatou sua situação no Centro municipal de Saúde Heitor Beltrão, foi encaminhada para um especialista em glaucoma, no Centro Carioca de Olho (CCO), inaugurado em fevereiro, que integra o complexo do Supercentro.

— Em uma semana, foi marcada minha consulta. A doutora que me atendeu fez um monte de exames e marcou alguns mais específicos, para saber se o caso é cirúrgico. Já estou usando um colírio específico para glaucoma, receitado por ela, e fiz exame de grau — detalha a aposentada.

No atendimento, enquanto avançava pelo quarto capítulo do livro “1808”, de Laurentino Gomes, Maria Neida questionou o diretor-geral do CCO, Rodrigo Pegado:

— Deus me livre deixar de ler. Tenho risco de ficar cega, doutor? Minha tia ficou.

Pegado tranquilizou a idosa, explicando que o grande problema do glaucoma é quando o paciente “não cuida”. Com uso do colírio e o acompanhamento médico, Maria não correria riscos.

Transplantes em 2024

A esperança dela e de outros pacientes aumentou com a melhora dos números da fila no Sisreg. Na prática, a fila é considerada zerada quando o paciente consegue fazer o agendamento imediato, sem precisar aguardar vaga para ter marcação realizada. Ao todo, de acordo com a SMS, 2.500 pessoas são recebidas diariamente no Supercentro, sendo 1.100 delas apenas no Centro de Olho — o local realiza 80% dos atendimentos oftalmológicos da rede pública da capital.

O secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz, calcula que, até 2024, a unidade passe a realizar transplante de córnea, hoje feito nas redes estadual e federal. Segundo dados do Portal da Transparência, na área de oftalmologia no SUS da capital, a diminuição no número de pedidos à espera foi mais expressiva em “consulta em oftalmologia – glaucoma”. A fila passou de 4.780 em janeiro de 2021 (início da gestão atual) para 182 em abril deste ano.

Logo atrás, a “consulta em oftalmologia – pediatria”, que tinha 4.393 nomes, chegou a 270 no mesmo período, assim como a busca por “oftalmologia – mapeamento de retina”, que saiu de 3.573 e para 142. Os dados de alguns procedimentos aparecem em branco no sistema e a explicação para isso, segundo a SMS, é que, atualmente, exames são feitos já na consulta inicial. Antes, havia necessidade de outro agendamento.

Avanços devem ser comemorados, mas, por outro lado, o número de pedidos em fila disparou no caso de procedimentos como “consulta em oftalmologia – plástica ocular”, que saiu de 130 em janeiro de 2021 para 1.320 em abril de 2023. No mesmo período, também piorou a situação para quem busca “consulta em oftalmologia – retina geral”, em que o número de pacientes à espera foi de 1.227 para 3.197; e “consulta em oftalmologia – geral”, que pulou de 233 para 5.020.

Luzia Ribeiro, doméstica de 64 anos, e na fila há muito tempo, também encontrou razões para comemorar:

— Marquei em fevereiro e foram me chamar agora. Já estava há 10 anos esperando (pela cirurgia) e nunca me chamavam. Meu caso é de plástica ocular, que atrapalha a visão, porque a pele caída deixa a vista embaçada.

A explicação para os casos de aumento da fila, de acordo com a SMS, é que “havia uma demanda reprimida” por esses serviços. A projeção é de que as filas sejam zeradas nos próximos 8 meses.

— A população não acredita no sistema e desiste de procurar, bem como os médicos desistem de indicar. É uma cadeia errada, mas quando se vê que funciona, volta a procura — explica o diretor do CCO.

Promessas até fim do ano

O Supercentro Carioca de Saúde tem área de 22 mil metros quadrados. Além do Centro do Olho, também abriga os centros Carioca de Especialidades e de Diagnóstico e Tratamento por Imagem, que oferecem atendimentos de 8h a 22h nos dias úteis, e de 8h a 17h nos sábados.

Em visita ao local, no último dia 31, Daniel Soranz foi cumprimentado por pacientes enquanto caminhava pelos corredores, mas também ouviu manifestações de insatisfação. Uma das queixas partiu da cuidadora de idosos Katia Santos, 65, que disse estar esperando há três anos por cirurgia.

— Quando fiz uma ultra, a médica disse que estou com a vesícula muito dilatada. Fico com dor e preocupada, mas me seguro com Deus e água benta — disse.

— Ninguém vai conseguir resolver todos os problemas do sistema num curto espaço de tempo, mas nunca o SUS cresceu tanto em acessos como no último ano, com a construção do Supercentro — observou o secretário.

Veja também: Daniel Soranz: O novo INCA precisa sair do papel

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