O Globo – 02/09/2023
Rotinas de imunização instituídas em cinco décadas contribuíram muito para reduzir a mortalidade infantil
Por Daniel Soranz
Neste mês, o Programa Nacional de Imunizações (PNI) completa 50 anos. Como sanitarista e médico de família, me orgulho de ter no Brasil o melhor programa de imunizações do mundo, que honra o legado de Oswaldo Cruz. Infelizmente, o trabalho sério de meio século foi posto em xeque nos últimos anos por um negacionismo absurdo, que causou enorme retrocesso. Ao chegarmos a este marco, nós, profissionais de saúde e sociedade, temos o grande desafio de recuperar a consciência e as coberturas vacinais de nossas crianças, não permitindo a volta de doenças que, no passado, tanto aterrorizaram as famílias brasileiras.
O PNI foi criado em 1973 para consolidar a tradição de campanhas de vacinação que já haviam erradicado doenças como a varíola. As rotinas de imunização instituídas ao longo de cinco décadas contribuíram muito para a redução da mortalidade infantil, protegendo os brasileirinhos das doenças evitáveis pelas vacinas.
São mais de 40 diferentes imunobiológicos oferecidos gratuitamente, incluindo os especiais, voltados a pacientes com condições clínicas específicas. Além das vacinas de rotina para crianças, adultos e idosos, campanhas como a da influenza mantêm a proteção da população, em especial dos mais vulneráveis às complicações das doenças. Sem falar na vacinação contra a Covid-19, um sucesso com 20 milhões de doses aplicadas no município do Rio até agora, ajudando a controlar a pandemia que ceifou mais de 700 mil vidas no Brasil, 38 mil na cidade.
Apesar desses avanços, ainda há espaço para a incorporação de outras vacinas, como a HPV nonovalente — que protege contra nove sorotipos, mais potente que a atual, que protege contra quatro. Outro importante ponto seria adotar o CPF como identificador de cada cidadão nas bases digitais de dados.
Desde 2012, mais intensamente a partir de 2016, as coberturas vacinais vêm caindo no Brasil, e não podemos deixar de considerar o próprio sucesso do PNI como uma das causas. O último registro de poliomielite no país foi em 1989. Desde 2008 não há caso confirmado de rubéola. Em 2016, havíamos recebido a certificação de eliminação do sarampo. No passado, as famílias conheciam a gravidade dessas doenças e corriam para vacinar seus filhos. Quando, justamente devido à imunização, o cenário deixa de assustar, é preciso conscientizar sobre a importância das vacinas as mães e os pais que nunca viram casos dessas doenças. Elas existem sim, são graves, podem matar ou deixar sequelas permanentes.
No Rio, trabalhamos no resgate das coberturas vacinais, que por aqui começaram a cair em 2019. Além das 238 salas de imunização distribuídas por toda a cidade, inauguramos em fevereiro deste ano o Super Centro Carioca de Vacinação, em Botafogo, com funcionamento todo dia, até 22h. Em maio, lançamos o Geovacina Rio, que mostra no mapa onde estão os bebês menores de 1 ano com dose atrasada, dando mais eficiência às buscas ativas que nossas unidades fazem para que nenhuma criança fique para trás. A ferramenta já ajudou a ampliar as coberturas da Pentavalente, Meningo C, Pneumo 10, Tríplice, contra poliomielite e rotavírus. Também iniciamos, na volta às aulas, o Programa Vacina na Escola, para levar a imunização a quase 2 mil unidades de ensino e creches públicas, além das particulares que quiserem participar. E, junto à Campanha Nacional de Multivacinação, que começou em 23 de agosto, lançamos o Vacina, Rio, uma grande mobilização intersetorial pela imunização.
Vacinação é um pacto social. O cinquentão PNI e a prefeitura do Rio estão fazendo sua parte, e é preciso que a população também abrace essa causa.
*Daniel Soranz é secretário municipal de Saúde do Rio de Janeiro
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